Daí você acorda tarde e está passando pela rua e o sujeito é atropelado na sua frente mas você não pára porque ele já foi atropelado mesmo e você está atrasado para o dentista e você não pode faltar no seu dentista porque ele faz trabalho voluntário com crianças em Goiás e só passa cinco dias do mês no consultório e você não pode trocar de dentista porque demorou para achar um que não esbarrasse o pinto no seu joelho sem querer ou que não tivesse tatuado nas costas um personagem do livro O Iluminado porque ninguém pode confiar sua saúde a um profissional que gosta de histórias de terror. E eu duvido que aquele cara atropelado tá doendo mais que aquela cárie criminosa que tá te incomodando desde a Sexta-feira passada.
Então você simplesmente passa por ele , sem dizer nada, sem se preocupar em parar e sem ao menos sentir culpa nisso, porque alguém vai parar, alguém vai acudir aquele moribundo sanguinolento no meio da estrada, alguém precisa retirar aquele monte de carne que está atrapalhando o trânsito e a Nove de Julho já está com congestionamento em ambos os sentidos e a Rebouças, bem, a Rebouças sempre tem um morimbundo sanguinolento na Rebouças, é a única explicação para tanto trânsito em um único lugar .
E você chega até o metrô e aguarda sua vez de entrar mesmo quando ninguém mais aguarda e você é empurrada porque as pessoas tem pressa. As pessoas tem dentistas e cabelereiros e cuidar da filha da vizinha e hoje tem tapa na cara na novela, e ninguém pode perder. As pessoas tem pressa porque elas tão passando 80% de suas vidas dentro de um transporte e isso não dá qualidade de vida, não, é o que as revistas dizem, não é mesmo?
E ali, na rua Vicente Maia, aquele corpo permanece na podridão. Ele decompõe, ele desfigura, e o calor é tão grande que ele quase se dissolve no asfalto. E ele fede. Ele fede muito. As pessoas passam por ele, eu passo por ele, ninguém sente absolutamente nada. Ninguém percebe cheiro nenhum.
É que nesse ponto da vida, já estamos todos nós fedidos assim;
Então você simplesmente passa por ele , sem dizer nada, sem se preocupar em parar e sem ao menos sentir culpa nisso, porque alguém vai parar, alguém vai acudir aquele moribundo sanguinolento no meio da estrada, alguém precisa retirar aquele monte de carne que está atrapalhando o trânsito e a Nove de Julho já está com congestionamento em ambos os sentidos e a Rebouças, bem, a Rebouças sempre tem um morimbundo sanguinolento na Rebouças, é a única explicação para tanto trânsito em um único lugar .
E você chega até o metrô e aguarda sua vez de entrar mesmo quando ninguém mais aguarda e você é empurrada porque as pessoas tem pressa. As pessoas tem dentistas e cabelereiros e cuidar da filha da vizinha e hoje tem tapa na cara na novela, e ninguém pode perder. As pessoas tem pressa porque elas tão passando 80% de suas vidas dentro de um transporte e isso não dá qualidade de vida, não, é o que as revistas dizem, não é mesmo?
E ali, na rua Vicente Maia, aquele corpo permanece na podridão. Ele decompõe, ele desfigura, e o calor é tão grande que ele quase se dissolve no asfalto. E ele fede. Ele fede muito. As pessoas passam por ele, eu passo por ele, ninguém sente absolutamente nada. Ninguém percebe cheiro nenhum.
É que nesse ponto da vida, já estamos todos nós fedidos assim;
3 comentários:
Profundo isso!!
Esse texto tem o timing da vida da gente, acelerado, mil palavras emendadas umas as outras,parece que estou dentro da sua cabeça enquanto vc caminha pelas ruas de Sampa.
Muito bom :)
É essa a idéia, Onecoffplease, que bom que gostou ^^
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